segunda-feira, 20 de abril de 2009

Homenagem a Jônatas Conceição*

"Morreu na luta, mas a luta não morre". Uso este texto de Cleidiana Ramos, publicado em seu blog em A Tarde para homenagear o companheiro Jônatas Conceição, um dos fundadores do MNU e responsável por colocar na consciência de tantos jovens a necessidade da luta contra o racismo. Faleceu no dia 3 de abril de 2009. Suas idéias e ideais não morrem nunca.
Luiz Carlos Suíca

A deputada Marizete Pereira (PMDB-BA) apresentou, hoje (08/04/09), na Assembléia Legislativa, uma moção de pesar pelo falecimento de Jônatas Conceição, ocorrido no último dia 3. É a primeira de certamente muitas outras homenagens que devem vir à grande figura intelectual e humana que Jônatas foi.

"Não tive a honra e a oportunidade do convívio com Jonatas. Fiquei impressionada e orgulhosa por suas obras e pela sua abnegação quando o tema era negritude. Portanto, diante da sua prematura partida deixo ao seu filho Kayodê, sua esposa Maria Luiza Passos, familiares e militantes do movimento negro, o nosso desejo de conforto espiritual e a certeza de que as obras deixadas por Jonatas servirão de exemplo para que gerações futuras possam usufruir de uma fonte inesgotável de sabedoria e luta libertária em favor do povo negro", diz um trecho da moção.

Acrescento aqui algumas informações que faltaram tanto no post anterior como na matéria publicada em A TARDE e assinada por mim: Jônatas graduou-se em Letras Vernáculas com Francês em 1975 pela Ufba e especializou-se em Linguística e tinha os títulos de mestre e doutor.

Além das já conhecidas atuações de Jônatas na militância política e no Ilê Aiyê, ele também teve uma relação muito forte com o rádio. A jornalista Olívia Soares, num telefonema emocionado após saber da partida do amigo, me contou o pioneirismo de Jônatas em trazer para o rádio a discussão sobre temas raciais num programa mantido pelo Irdeb no governo Waldir Pires. Jônatas voltou ao Irdeb via o Tambores da Liberdade.

Em sua primeira passagem pelo Irdeb, Jônatas conviveu de forma mais próxima com um grande amigo meu, o jornalista José Bonfim. Foi através de Bonfim que comecei a admirar Jônatas, de longe, por conta das suas idéias. Bonfim, o encontrava regularmente, por conta de um baba que juntava vários jornalistas e rendia divertidíssimas histórias.

Infelizmente para mim só fui conhecê-lo pessoalmente muito mais tarde e em encontros rápidos para matérias, mas o que ainda sim considero privilégio.

Adeus ao poeta Jônatas*

O poeta, escritor e um dos mais importantes intelectuais do movimento negro brasileiro, Jônatas Conceição, 56 anos, faleceu na manhã de hoje no Hospital da Cidade por conta de um câncer digestivo. O sepultamento será às 16h30 no Jardim da Saudade.

Jônatas atuou em várias frentes na luta contra o racismo e valorização da identidade e culturas negras: movimento social, literatura, Carnaval e academia.

"Jônatas era um poeta profundamente ligado às suas raízes em Saubara. Eu sempre disse que ele vivia ‘saubariando’ a vida", disse, emocionado, o poeta José Carlos Limeira, um dos grandes amigos de Jônatas e companheiro nas letras.

Jônatas foi um dos militantes pioneiros do Movimento Negro Unificado (MNU) e era diretor do bloco afro Ilê Aiyê onde elaborava os cadernos educativos da instituição. Foi professor da Uneb e desenvolveu sua pesquisa de mestrado sobre a poesia dos quilombos intitulada Vozes Quilombolas – Uma Poética Brasileira, publicada em 2005. Em 2000 publicou em companhia de Lindinalva Barbosa a antologia Quilombo de Palavras- a literatura dos afro-descendentes, dentre outras várias obras.

"Era um guerreiro incansável na sua aparente quietude. Acho que era como a própria água, um elemento ao qual ele era muito ligado. Ele ia operando transformações profundas de uma maneira na maioria das vezes silenciosa", destaca o também poeta e grande amigo de Jônatas, Landê Onawale.

A literatura foi o principal veículo do vigor político e guerreiro de Jônatas, dono de uma personalidade introspectiva. "Jônatas tinha aquele jeito tímido, calado introspectivo, mas transpirava o amor por suas raízes, pelos orixás e pelo Ilê Aiyê", completa Limeira.

Era nos textos que Jônatas deixava transparecer seu pensamento sobre questões como o racismo e desigualdade. "No seu jeito calado ele era radical, no sentido, de como diz sua irmã Ana Célia, de quem segue as coisas com horizontalidade e profundidade, como uma raiz. Neste sentido Jônatas realmente deixou marcas profundas em todos os ambientes nos quais atuou", completa Landê.

Pioneirismo é também uma outra palavra bastante usada pelos amigos para defini-lo. Jônatas era um dos mais freqüentes colaboradores do Cadernos Negros, a mais importante publicação brasileira para divulgação da literatura negra.

Em 2007, numa entrevista A TARDE sobre o lançamento de uma edição do Cadernos em Salvador, ele disse: "Infelizmente, os escritores negros são ainda vozes marginais, no sentido de não conseguirmos furar o bloqueio editorial brasileiro, que é baseado numa ideologia elitista e branca, também em relação à temática, como se nós, negros, não produzíssemos cultura".

Guardião do compromisso de contar a história de luta do povo negro ele foi o responsável por compilar textos que contam a história de formação do MNU, na coletânea Movimento Negro Unificado- 1978-1988-10 anos de luta contra o racismo. Jônatas deixa um filho de 12 anos, Kayodê.
*Cleidiana Ramos

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