quarta-feira, 22 de abril de 2009

Por uma Educação digna para o nosso povo

Tenho atuado como sindicalista junto a minha categoria, os trabalhadores em limpeza, e na luta comunitária do Pernambués, bairro popular onde tenho minhas raízes. Com este perfil não poderia deixar de estar ao lado dos estudantes, funcionários e professores que lutam por uma escola pública, gratuita e de qualidade.

No Brasil existe uma distância entre a lei e o mundo real. A Constituição Federal diz que a Educação é um direito de todos e dever do Estado. Isso ocorre no dia-a-dia? Existe uma lei aprovada que assegura um piso nacional para o magistério no valor de R$950,00. A lei foi sancionada em 2008 e prevê que o piso nacional seja pago a todos os professores da rede pública para uma carga horária de 40 horas semanais, a partir de 2010. O que tem sido feito para que isso ocorra. Apóio o movimento dos trabalhadores que ocorre no dia 24 de abril em todo o Brasil para que a lei saia do papel.
Aqui na Bahia vivemos um contraste ainda maior. O governador Jaques Wagner e toda a cúpula da Secretaria da Educação (SEC), nos governos anteriores, criticavam a contratação sem concurso e a utilização do tal Regime Especial de Direito Administrativo (Reda). Agora no governo todos mudaram. Realizar concurso e contratar professores concursados virou um estorvo que só “oneraria os cofres estaduais”. Será que aquilo que vale para Francisco não vale para Chico?

A contratação, mesmo precária através do Reda, só ocorreu depois da positiva interferência do Ministério Público Estadual (MPE). O tal compromisso de campanha eleitoral de “evolução através da educação” ao que parece ficou no passado. Enquanto a APLB-Sindicato (Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado da Bahia) afirma que há um déficit de cerca de 10 mil professores o que tem prejudicado o ensino público na Bahia, o governo estadual pressionado selecionará 1.508 professores por Reda. Isso pode ser qualquer coisa menos uma política pública para a educação pública que atende em sua quase totalidade a população carente.

A SEC pode dizer que não sabe da existência de desvios de funções onde professores habilitados em algumas matérias são responsáveis por outras para as quais eles não se formaram? Será que um aluno da periferia que está sem aula por falta de professor em sala de aula pode disputar com um pouco de possibilidade um vestibular para uma universidade pública? Os dados da APLB-Sindicato falam por si: são cerca de 1.700 escolas estaduais e há déficit de professores em quase todas as escolas do interior. Em Salvador, a situação é mais grave em regiões do subúrbio e periféricas.

O discurso da “herança maldita” ficou velho depois de dois anos e quatro meses de mandato. É algo que não justifica a falta de uma ação correta na área de educação que deve ser pensada e repensada por pessoas capacitadas e de verdade qualificadas. Usar apenas o critério de filiação partidária já mostrou, no passado, que é algo que não contribui com o avanço desse setor na Bahia.

Por outro lado, como sindicalista, vejo um governo estadual omisso em relação aos trabalhadores terceirizados. Recentemente o Sindicato dos Trabalhadores em Limpeza do Estado da Bahia (Sindilimp-BA) enviou ofícios para Procuradoria Geral do Estado e para as Secretarias de Educação, Finanças e de Administração do Estado exigindo uma providência do governo em relação aos constantes atrasos nos pagamentos e condições inadequadas de trabalho aos funcionários terceirizados. A implantação do programa de metro quadro limpo, ou seja, o número de funcionários que atuam na limpeza é determinado pela área do local, como por exemplo, uma escola. Isso tem sobrecarregado os trabalhadores e o serviço tem se mostrado insuficiente.

As manifestações dos estudantes dos Colégios Estaduais Landulfo Alves e Hamilton de Jesus Lopes, localizados na Avenida Oscar Pontes, Água de Meninos, exigindo higiene adequada demonstram a veracidade de nossa crítica. Há trabalhadores em limpeza, sem receber salários, vale transporte e tíquete alimentação em dia.

Outra coisa que a SEC finge não ver é que em algumas escolas a limpeza, asseio e conservação só estão se dando em razão da ação da direção da unidade escolar e solidariedade e união de funcionários, professores e comunidade que fazem mutirão de limpeza para não deixar a escola imunda. Será que isso é o ideal para uma política de Estado para a Educação?

Para a população em geral, em especial para a juventude dos bairros populares e carentes, uma escola pública, gratuita e de qualidade é algo que representa a única alternativa para que ocorra a ascensão social. Destruir a educação pública é jogar na exclusão social milhares de jovens que serão atirados ninguém sabe onde. Depois não adianta chorar. Já passou da hora de mudar!

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Homenagem a Jônatas Conceição*

"Morreu na luta, mas a luta não morre". Uso este texto de Cleidiana Ramos, publicado em seu blog em A Tarde para homenagear o companheiro Jônatas Conceição, um dos fundadores do MNU e responsável por colocar na consciência de tantos jovens a necessidade da luta contra o racismo. Faleceu no dia 3 de abril de 2009. Suas idéias e ideais não morrem nunca.
Luiz Carlos Suíca

A deputada Marizete Pereira (PMDB-BA) apresentou, hoje (08/04/09), na Assembléia Legislativa, uma moção de pesar pelo falecimento de Jônatas Conceição, ocorrido no último dia 3. É a primeira de certamente muitas outras homenagens que devem vir à grande figura intelectual e humana que Jônatas foi.

"Não tive a honra e a oportunidade do convívio com Jonatas. Fiquei impressionada e orgulhosa por suas obras e pela sua abnegação quando o tema era negritude. Portanto, diante da sua prematura partida deixo ao seu filho Kayodê, sua esposa Maria Luiza Passos, familiares e militantes do movimento negro, o nosso desejo de conforto espiritual e a certeza de que as obras deixadas por Jonatas servirão de exemplo para que gerações futuras possam usufruir de uma fonte inesgotável de sabedoria e luta libertária em favor do povo negro", diz um trecho da moção.

Acrescento aqui algumas informações que faltaram tanto no post anterior como na matéria publicada em A TARDE e assinada por mim: Jônatas graduou-se em Letras Vernáculas com Francês em 1975 pela Ufba e especializou-se em Linguística e tinha os títulos de mestre e doutor.

Além das já conhecidas atuações de Jônatas na militância política e no Ilê Aiyê, ele também teve uma relação muito forte com o rádio. A jornalista Olívia Soares, num telefonema emocionado após saber da partida do amigo, me contou o pioneirismo de Jônatas em trazer para o rádio a discussão sobre temas raciais num programa mantido pelo Irdeb no governo Waldir Pires. Jônatas voltou ao Irdeb via o Tambores da Liberdade.

Em sua primeira passagem pelo Irdeb, Jônatas conviveu de forma mais próxima com um grande amigo meu, o jornalista José Bonfim. Foi através de Bonfim que comecei a admirar Jônatas, de longe, por conta das suas idéias. Bonfim, o encontrava regularmente, por conta de um baba que juntava vários jornalistas e rendia divertidíssimas histórias.

Infelizmente para mim só fui conhecê-lo pessoalmente muito mais tarde e em encontros rápidos para matérias, mas o que ainda sim considero privilégio.

Adeus ao poeta Jônatas*

O poeta, escritor e um dos mais importantes intelectuais do movimento negro brasileiro, Jônatas Conceição, 56 anos, faleceu na manhã de hoje no Hospital da Cidade por conta de um câncer digestivo. O sepultamento será às 16h30 no Jardim da Saudade.

Jônatas atuou em várias frentes na luta contra o racismo e valorização da identidade e culturas negras: movimento social, literatura, Carnaval e academia.

"Jônatas era um poeta profundamente ligado às suas raízes em Saubara. Eu sempre disse que ele vivia ‘saubariando’ a vida", disse, emocionado, o poeta José Carlos Limeira, um dos grandes amigos de Jônatas e companheiro nas letras.

Jônatas foi um dos militantes pioneiros do Movimento Negro Unificado (MNU) e era diretor do bloco afro Ilê Aiyê onde elaborava os cadernos educativos da instituição. Foi professor da Uneb e desenvolveu sua pesquisa de mestrado sobre a poesia dos quilombos intitulada Vozes Quilombolas – Uma Poética Brasileira, publicada em 2005. Em 2000 publicou em companhia de Lindinalva Barbosa a antologia Quilombo de Palavras- a literatura dos afro-descendentes, dentre outras várias obras.

"Era um guerreiro incansável na sua aparente quietude. Acho que era como a própria água, um elemento ao qual ele era muito ligado. Ele ia operando transformações profundas de uma maneira na maioria das vezes silenciosa", destaca o também poeta e grande amigo de Jônatas, Landê Onawale.

A literatura foi o principal veículo do vigor político e guerreiro de Jônatas, dono de uma personalidade introspectiva. "Jônatas tinha aquele jeito tímido, calado introspectivo, mas transpirava o amor por suas raízes, pelos orixás e pelo Ilê Aiyê", completa Limeira.

Era nos textos que Jônatas deixava transparecer seu pensamento sobre questões como o racismo e desigualdade. "No seu jeito calado ele era radical, no sentido, de como diz sua irmã Ana Célia, de quem segue as coisas com horizontalidade e profundidade, como uma raiz. Neste sentido Jônatas realmente deixou marcas profundas em todos os ambientes nos quais atuou", completa Landê.

Pioneirismo é também uma outra palavra bastante usada pelos amigos para defini-lo. Jônatas era um dos mais freqüentes colaboradores do Cadernos Negros, a mais importante publicação brasileira para divulgação da literatura negra.

Em 2007, numa entrevista A TARDE sobre o lançamento de uma edição do Cadernos em Salvador, ele disse: "Infelizmente, os escritores negros são ainda vozes marginais, no sentido de não conseguirmos furar o bloqueio editorial brasileiro, que é baseado numa ideologia elitista e branca, também em relação à temática, como se nós, negros, não produzíssemos cultura".

Guardião do compromisso de contar a história de luta do povo negro ele foi o responsável por compilar textos que contam a história de formação do MNU, na coletânea Movimento Negro Unificado- 1978-1988-10 anos de luta contra o racismo. Jônatas deixa um filho de 12 anos, Kayodê.
*Cleidiana Ramos